Domingo, 10 de Julho de 2011

A ETERNIDADE DE UMA INSTITUIÇÃO

 (*)

 

Em 14 de Maio, o Real Gabinete Português de Leitura completou 174 anos de existência. Ao correr deste tempo, caiu o Império, foi implantada a República, sucederam-se os governos – e o mundo inteiro passou por transformações e mudanças profundas, desde o traçado da geografia política ao crescimento demográfico, desde os avanços científicos e tecnológicos à economia e às estruturas sociais, desde as crenças e os costumes, à produção e à riqueza.

 

Poucas são as instituições que conseguem atravessar um ciclo existencial tão longo, sem perderem a identidade ou desaparecerem, principalmente quando não têm escoras oficiais para serem sustentadas. Fenómeno idêntico acontece com as famílias, quando morrem os patriarcas; ou com as empresas, quando perdem os fundadores e os pioneiros. Quase sempre definham e extinguem-se.

 

Por isso, não deixa de ser notável que uma associação, fundada poucos anos depois de proclamada a Independência do Brasil, por algumas dezenas de emigrantes portugueses, com a finalidade de difundir a Cultura e o Conhecimento entre aqueles compatriotas que chegavam ao país de destino com “poucas letras”, tenha resistido às transformações e reformas que moldaram o Brasil que somos hoje.

 

Na base deste fenómeno de sobrevivência – íamos escrever “milagre” – do Real Gabinete Português de Leitura, podemos apontar diversas causas, mas duas foram fundamentais e permanentes: o húmus do patriotismo e o preceito da gratidão. O primeiro, fez com que uma comunidade reunisse e colocasse ao alcance de qualquer um do povo o melhor que o génio lusitano já produziu: a criação de seus escritores, o cântico da sua Epopeia e a alquimia da sua Arte. Para isso, juntou livros e manuscritos, obras raras e cimélios quinhentistas; reproduziu em pedra de liós, no centro da Cidade, os recortes manuelinos do Mosteiro dos Jerónimos; e construiu um “templo camoniano” para louvar todos aqueles “em quem poder não teve a morte”.

 

Essa é a expressão do patriotismo e o culto da lusitanidade que atravessaram gerações. Tudo se fazia no Real Gabinete Português de Leitura por amor e para louvação da terra de origem: as obras adquiridas, os patrimónios investidos, as colecções guardadas. Mas a juntar-se a esse húmus patriótico estava uma segunda causa, que foi o reconhecimento ao Brasil. Este, senhor de seu destino desde 1822, continuava a receber, todos os anos, milhares de portugueses, que vinham realizar seus projectos de vida. Nas pedras rosadas da fachada; nas estátuas dos Poetas e dos Navegadores; nas estantes dos livros e nas pinturas de José Malhoa; no Salão dos Brasões e no “Altar da Pátria”, na “Clavis Prophetarum” do Padre António Vieira e na edição “princeps” de “Os Lusíadas”; nos autógrafos do “Amor de Perdição”, e do “Amor só tu por amor” de Machado de Assis – estavam patentes os símbolos da gratidão dos portugueses ao País de acolhimento. E como essa gratidão é eterna, também eterno será o Real Gabinete Português de Leitura: ontem, considerado “sacrário” dos emigrantes que chegavam, hoje, transformado em “oficina” dos mestres e dos jovens que gostam do “Portugal a haver”.

A. Gomes da Costa

Presidente da Federação das Associações Portuguesas e Luso Brasileiras

In Revista Lusofonia, São Paulo

 

(*)http://www.google.pt/imgres?imgurl=http://www.djibnet.com/photo/2294823350-real-gabinete-portugues-de-leitura.jpg&imgrefurl=http://www.djibnet.com/photo/leitura/real-gabinete-portugues-de-leitura-2294823350.html&usg=__zgIPZbHhJrgAxOgCr-j_dgOjmLw=&h=474&w=500&sz=168&hl=pt-PT&start=17&sig2=ywvptUPxlKQ5veP2BuPOCg&zoom=1&tbnid=rr4RcnSY3pcUwM:&tbnh=114&tbnw=136&ei=WUIZTprvDcGO8gPv54gs&prev=/search%3Fq%3DReal%252BGabinete%252BPortugu%25C3%25AAs%252Bde%252BLeitura%26um%3D1%26hl%3Dpt-PT%26sa%3DN%26biw%3D1093%26bih%3D538%26tbm%3Disch&um=1&itbs=1&iact=hc&vpx=659&vpy=208&dur=53&hovh=219&hovw=231&tx=116&ty=195&page=2&ndsp=18&ved=1t:429,r:4,s:17&biw=1093&bih=538

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Domingo, 26 de Junho de 2011

Associação Lusófona de Ciência...

 

...foi ontem constituída em Bragança

  

Bragança, 25 jun (Lusa) - Vai ser hoje criada oficialmente, em Bragança, a Associação Lusófona e Internacional de Administradores de Ciência (ALeIAC), entidade que terá como objetivo a gestão e administração de ciência nos países em que o Português é a língua materna.

 

O director adjunto do Instituto Gulbenkian de Ciência e membro do Conselho da Associação Europeia de Administradores e Gestores em Ciência (EARMA), José Mário Leite, destacou, em declarações à Agência Lusa, a importância desta associação para os países lusófonos: "Com a constituição da ALeIAC, Portugal assume-se como um país ponta de lança em Bruxelas, na área da gestão e administração de ciência em países lusófonos, de forma a haver uma maior aproximação com países como Brasil, Angola, Cabo Verde, Moçambique ou Timor", acrescentou.

 

Lusa

 

http://aeiou.expresso.pt/cplp-associacao-lusofona-de-ciencia-e-hoje-constituida-em-braganca=f657758

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Quarta-feira, 22 de Junho de 2011

HOMENAGEM À PRESIDENTA INTERNACIONAL...

 

...COMPANHEIRA MARIA INÊS BOTELHO

LISBOA, 21 DE JUNHO DE 2011

 

 

 

Muito Prezada Presidenta Internacional, Companheira Maria Inês Botelho;

 

Prezados Companheiros;

 

Minhas Senhoras e meus Senhores:

 

 

  • Foi nesse 14 de Agosto de 1385 que em Aljubarrota mostrámos do que somos capazes em defesa do solo herdado e é por esta Pátria que aqui estamos;

 

  •  Foi no dia 22 de Agosto de 1415 que em Ceuta nasceu o Ultramar português e é por todos os povos amigos que aqui estamos;

 

  • Cumpriram-se no passado 20 de Maio os 513 anos da chegada de Vasco da Gama à Índia (1498) e é por uma visão estratégica que aqui estamos;

 

  • O dia 22 de Abril de 1500 foi a alvorada da glória lusíada nas Américas e é na sua consagração que aqui estamos;

 

  • A Província (portuguesa) do Oriente da Companhia de Jesus tinha sede em Goa e jurisdição desde o Cabo da Boa Esperança até Nagasaki e é por essa Fé que aqui estamos.

 

Sim, muitos foram os teatros por que andámos e se do nosso velho gládio denigrem hoje por cá alguns dos herdeiros de derrotas que infligimos, é por lá que afinal perdura a defesa dos Valores que então lhes legámos e tocam de novo os clangores quando por lá passamos.

 

Não faz sentido criticar a História com base em Valores à época desconhecidos nem colhe discuti-la; reconheçamos que nem sempre fomos Santos e tenhamos a sensatez de aprender com a História que escrevemos.

 

E se essa História se mede por séculos recheados de glória, também a devemos medir por anos e até por meses ou dias. Quando analisamos a nossa História que alguém hoje escreve por nós, não podemos deixar de meditar profundamente como foi possível uma Nação passar tão rapidamente de cabeça de Império a parte menor duma congregação de Estados cada vez menos soberanos e muito raramente solidários.

 

Mas não enjeitemos as culpas. Pelo contrário, façamos da sua assumpção o tema de reflexão e a base de lançamento para os novos rumos que nos hão-de trazer de volta o orgulho em substituição da vergonha, a largueza de horizontes que substitua a pequenez, a esperança num futuro doirado em vez do endividamento galopante.

 

Prezados Companheiros;

Minhas Senhoras e meus Senhores:

 

Está nas nossas mãos – e não nas de mais ninguém – a definição dos caminhos a trilhar na construção de um novo Mundo Lusíada: tomemos a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa como uma realidade fantástica em vias de aperfeiçoamento permanente mas lembremo-nos de todos aqueles outros povos que ficaram de fora. E são tantos... São todos aqueles que ao longo da História, algures no mundo, Portugal administrou e que, por vicissitudes várias, abandonou. Esses, os «portugueses abandonados», ficaram nos seus territórios a crer na Fé que lhes levámos, a falar a língua que lhes ensinámos, a sonhar com um Portugal que poucos ou praticamente nenhuns alguma vez pisaram mas que continuam a ter como a Casa-Mãe da Civilização por que optaram.

 

Muitos, os casos em que passaram séculos de abandono.

 

Recordemos os «portugueses» do Sri Lanka, católicos romanos, que em Batticaloa e Trincomalee sofreram as agruras da guerra civil entre indús e budistas e que, maior pena pesada sofrida, se viram fustigados pelo tsunami de 26 de Dezembro de 2004. O que fizemos por eles? Institucionalmente, nada!

 

Recordemos os cristãos das Celebes e das Molucas que tanto sofreram com o isolamento a que se viram votados só pelo facto de os seus Rajás terem sido «irmãos» do Rei de Portugal.

 

Recordemos os lusófonos da Costa do Malabar que tanto têm pugnado pela Cultura Indo-Portuguesa e ainda hoje são praticamente ignorados nas suas aspirações.

 

Recordemos os Melungos, esses remotos descendentes dos soldados e marinheiros dos Algarves d’aquém e d’além mar que acompanharam os irmãos Corte Real no desbravamento da costa oriental americana, sempre e ainda residentes na Apalachia e que hoje, todos estes séculos passados, se dizem luso-descendentes. Que temos feito por eles? Nada!

 

E que dizer da Guiné-Bissau onde se estima que apenas cerca de 15% da população fala português?

 

E quantos exemplos mais poderia citar se o tempo fosse de inventários em vez de acção urgente...

 

Eis o que por eles podemos fazer: ensinar-lhes a nossa língua, a que havemos de arvorar como o grande instrumento da paz no séc. XXI.

 

E contra ventos e marés havemos de o conseguir pois

 

Aqui ao leme sou mais do que eu:

Sou um povo que quer o mar que é teu;

E mais que o mostrengo, que me a alma teme

E roda nas trevas do fim do mundo,

Manda a vontade, que me ata ao leme,

D' El-rei D. João Segundo!

 

Muito obrigado!

 

Lisboa, 21 de Junho de 2011

 

Bragança_2007-1.jpg Henrique Salles da Fonseca

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Segunda-feira, 20 de Junho de 2011

PIB PER CAPITA DOS 181 PAISES MEMBROS DO FMI

Base: Ano de 2010

 

Fonte: Fundo Monetário Internacional (FMI)

 

 

 

 

Clas.

PAÍS

US$

1

 Qatar

88,232

2

 Luxemburgo

80,304

3

 Singapura

57,238

4

 Noruega

52,238

5

 Brunei

47,200

6

 Estados Unidos

47,123

 Hong Kong

45,277

7

Suíça

41,765

8

 Países Baixos

40,777

9

 Austrália

39,692

10

 Áustria

39,454

11

 Canadá

39,033

12

 Irlanda

38,685

13

Kuwait

38,293

14

 Suécia

37,775

15

Emirados
  Árabes Unidos

36,973

16

 Dinamarca

36,764

17

 Islândia

36,681

18

 Bélgica

36,274

19

 Alemanha

35,930

20

 Reino Unido

35,053

21

Taiwan

34,743

22

 Finlândia

34,401

23

 França

34,092

24

 Japão

33,828

25

 Coreia do Sul

29,791

26

 Espanha

29,651

27

 Itália

29,418

28

 Israel

29,404

29

 Grécia

28,833

30

 Chipre

28,045

31

 Eslovénia

27,899

32

 Nova Zelândia

27,460

33

Bahrein

26,807

34

Omã

26,197

35

Bahamas

25,884

36

 República Checa

24,987

37

Seychelles

24,837

38

 Malta

24,081

39

Arábia Saudita

23,742

40

 Portugal

23,113

41

Barbados

22,296

42

 Eslováquia

22,267

43

Trinidad e Tobago

20,137

44

 Polónia

18,837

45

 Hungria

18,815

46

Guiné Equatorial

18,387

47

 Estónia

18,274

48

 Croácia

17,608

49

 Lituânia

16,997

50

Antígua e Barbuda

16,566

51

 Rússia

15,807

52

Argentina

15,603

53

Botswana

15,449

54

Líbano

15,331

55

 Chile

14,982

56

Líbia

14,878

57

Gabão

14,865

58

 Malásia

14,603

59

Uruguai

14,342

60

 Letónia

14,330

61

 México

14,266

62

Bielorrússia

13,864

63

 Turquia

13,392

64

Maurícia

13,214

65

 São
  Cristóvão e Nevis

12,976

66

 Cazaquistão

12,401

67

 Panamá

12,397

68

 Bulgária

12,052

69

 Venezuela

11,889

70

 Roménia

11,766

71

Brasil

11,289

72

 Irão

11,024

73

Granada

10,881

74

 Sérvia

10,808

75

Costa Rica

10,732

 Mundo

10,725

76

África do Sul

10,505

77

Dominica

10,456

78

 Montenegro

10,432

79

Santa Lúcia

10,227

80

São Vicente
  e Granadinas

10,261

81

 Azerbeijão

9,953

82

 Tunísia

9,488

83

 Colômbia

9,445

84

 Macedónia

9,350

85

 Peru

9,281

86

Suriname

8,955

87

 Jamaica

8,811

88

República
  Dominicana

8,647

89

 Tailândia

8,643

90

Equador

7,951

91

Belize

7,894

92

 Bósnia e
  Herzegovina

7,751

93

 China

7,518

94

El Salvador

7,442

95

 Albânia

7,381

96

Tonga

7,134

97

 Argélia

7,103

98

Namíbia

6,945

99

Guiana

6,893

100

 Ucrânia

6,665

101

 Turquemenistão

6,597

102

Angola

6,412

103

 Egipto

6,367

104

Kiribati

6,181

105

Suazilândia

5,884

106

Samoa

5,731

107

Jordânia

5,658

108

Butão

5,533

109

Maldivas

5,483

110

 Arménia

5,178

111

 Síria

5,108

112

Sri Lanka

5,103

113

 Geórgia

5,057

114

Paraguai

4,915

115

 Guatemala

4,871

116

 Vanuatu

4,807

117

 Marrocos

4,773

118

 Bolívia

4,584

119

República do Congo

4,487

120

Fiji

4,450

121

Honduras

4,404

122

Indonésia

4,380

123

Mongólia

3,727

124

Filipinas

3,725

125

Iraque

3,599

126

Cabo
  Verde

3,562

127

 Índia

3,290

128

Vietname

3,123

129

 Uzbequistão

3,022

130

Ilhas Salomão

2,974

131

Nicarágua

2,969

132

 Moldávia

2,959

133

Paquistão

2,789

134

Timor-Leste

2,663

135

Iémen/Iêmen

2,595

136

Djibouti

2,553

137

Sudão

2,466

138

Laos

2,435

140

Nigéria

2,398

141

Papua-Nova Guiné

2,302

142

Camarões

2,165

143

 Quirguistão

2,162

144

Mauritânia

2,099

145

Camboja

2,086

146

Tadjiquistão

1,907

147

 São Tomé e Príncipe

1,879

148

Senegal

1,814

149

 Quênia

1,784

150

Costa do Marfim

1,686

151

Chade

1,653

152

 Zâmbia

1,625

153

Gana

1,609

154

Bangladesh

1,565

155

Tanzânia

1,497

156

Benim

1,453

157

Burkina Faso

1,341

158

Lesoto

1,266

159

Nepal

1,250

160

Myanmar

1,246

161

Uganda

1,245

162

Mali

1,206

163

Ruanda

1,202

164

Comores

1,176

165

Haiti

1,121

166

Guiné-Bissau

1,082

167

Guiné

1,056

168

 Etiópia

1,018

169

Afeganistão

998

170

 Moçambique

982

171

Madagáscar

910

172

Malawi

908

173

Togo

847

174

Serra Leoa

803

175

República
  Centro-Africana

764

176

Níger

720

177

Eritreia

676

178

Burundi

410

179

Libéria

396

180

 Zimbabwe

395

181

República
  Democrática do Congo

 ???

publicado por elosclubedelisboa às 09:14
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Domingo, 19 de Junho de 2011

RICARDO SEVERO - 11

 

 

 

DISCURSO EM 3 DE SETEMBRO DE 1968 NA POSSE DE SÓCIO DO
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO PAULO, PELO

CÔNSUL-GERAL DE PORTUGAL

DR. LUÍS SOARES DE OLIVEIRA

TENDO COMO PATRONO RICARDO SEVERO

 

 

PROFETA DA COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA

 

 

 

Mas Severo foi mais longe na sua compreensão do problema. O conhecimento profundo que tinha da génese lusitana e das expressões modernas do fenómeno, através da sua repetição no trópico africano e americano, permitiu-lhe uma visão segura do futuro inevitável das duas pátrias.

 

 

Repito aqui um trecho de artigo seu publicado em «O Estado de São Paulo» a 5 de Dezembro de 1918 e que, quase meio século depois, nos mostra a sua flagrante actualidade:

«O Oceano Atlântico representará, na época actual, o mesmo papel que o Mediterrâneo no período clássico do Ocidente. Em torno deste grande mar que banha três continentes, se desenvolverão os périplos da nova civilização so século XX. Os países que o marginam, com os seus vastos empórios, formarão uma cadeia cujos elos serão ligados por uma aliança de mútua conveniência, de similar política comercial e económica. Portugal tem na margem europeia um dos mais bem situados empórios, ligado a todos os centros, o Continente; na África Ocidental, os seus portos dominam um vastíssimo “hinterland”. O Brasil ocupa uma grande parte da margem americana do mesmo mar; a sua política de expansão tem de tomar o rumo do Atlântico; poderá fechar essa cadeia que representará a mais fecunda aliança do mundo dando fraternalmente as mãos ao velho Portugal. O porto franco de Lisboa e os mercados das vastas províncias portuguesas, oferecem os termos desse convénio luso-brasileiro que será para os dois países uma solução de mútuo desenvolvimento e progresso dentro do comércio mundial que abraça o grande Oceano».

 

*  *  *

 

A luz que durante 70 anos raiou tão brilhantemente sobre Portugal e sobre o Brasil, um dia extinguiu-se. Continuam entre nós os reflexos vivos das suas obras. Mas o homem, esse, inseriu-se no passado e tornou-se objecto da nossa saudade e do nosso culto. As suas obras e o seu pensamento constituíram-se em património de duas pátrias que se querem entre si como ele quis a ambas.

 

Ricardo Severo morreu como viveu: feliz, sem martírio e nas boas graças do seu belo destino. Símbolo de uma época, morreu com ela quando se desenhavam as primeiras escaramuças do conflito mundial que iria transformar o mundo alterando-lhe os equilíbrios e transformando-lhe a face. Ricardo Severo saberia, contudo, que o povo, esse fundo de rocha ígnea, permaneceria inalterável e insensível às erosões da superfície. E a grei que não se engana, amá-lo-á sempre pois sabe que Ricardo Severo lhe pertencia e que, se subiu tão alto nas escadas da glória, foi porque tudo o que fez foi feito «pola grey».

 

FIM

 

Luís Soares de Oliveira.bmp Luís Soares de Oliveira

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Sábado, 18 de Junho de 2011

RICARDO SEVERO – 10

 

 

 

DISCURSO EM 3 DE SETEMBRO DE 1968 NA POSSE DE SÓCIO DO
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO PAULO, PELO

CÔNSUL-GERAL DE PORTUGAL

DR. LUÍS SOARES DE OLIVEIRA

TENDO COMO PATRONO RICARDO SEVERO

 

 

PATRIARCA DA COLÓNIA

 

 

Esse amor ao povo português levaria o seu querido companheiro, senhor como ele de sólida cultura, o saudoso Professor Marques da Cruz, a atribuir a Severo o título de Patriarca da Colónia. Dizia Marques da Cruz: «embora apegado aos seus ideais, era tolerante e transigente com todos os patrícios, ostentando no seu aprumo de homem recto a fidalguia do seu garbo cavalheiresco atendendo a todos com o seu afecto e o seu conselho, apontando-lhes, como um guia seguro, a trilha fácil da solução de um problema e acorrendo sempre, de alma franca, aos salões de qualquer agremiação para prestigiar a sua actividade ou glorificar uma efeméride notável da História da pátria».

 

Ricardo Severo via na colónia portuguesa do Brasil um corpo de indivíduos irmanados pelo sentimento da saudade: «Não conheço raça que melhor conserve a respeito a tradição nacional. Como eu admiro e venero estes ignorados trovadores da sua terra natal e como me comovemos seus cantares, tanto mais sublimes e encantadores quanto mais humildes», dizia Severo numa reunião de portugueses.

 

Preocupado sempre com o engrandecimento do Brasil, Ricardo Severo entendia que a missão do português aqui não estava terminada. O português devia continuar a colaborar na constituição étnica da nacionalidade brasileira, integrar essa nacionalidade dos elementos tradicionalistas e contribuir pelo seu esforço para a prosperidade do Brasil.

 

Certo de que uma fé que se não desentranhe em frutos é uma fé inútil, Severo procurou materializar o amor dos portugueses a Portugal e ao Brasil em instituições que servissem às altas finalidades que prescrevia nos seus compatriotas. Sob a sua direcção, a colónia fundou em São Paulo a Câmara Portuguesa de Comércio e as Escolas Portuguesas destinadas a ensino gratuito às classes pobres onde o Professor Marques da Cruz viria a fazer uma grande obra pedagógica.

 

O grande sonho de Ricardo Severo consistiu, contudo, na construção em São Paulo de uma «Casa Portuguesa^, «a casa de toda a colónia e dentro da qual ela caiba em torno de uma só lareira»; um só lar que simbolize a Pátria, onde cada um encontre, para a sua saudade e o seu amor, carinhosa e mútua correspondência entre irmãos e na mais afectuosa e pacífica comunidade».

 

 

O seu sonho não pôde ter imediata realização dados os dissídios que sobrevieram na Colónia com o advento do regime Republicano em Portugal. Só mais tarde, resolvidos os conflitos políticos que dividiram os portugueses, foi então possível reunir à volta da ideia de Ricardo Severo o grupo de boas-vindas que permitiram a realização da obra. Ela aí está materializada nesse edifício da Avenida da Liberdade, com uma fachada portuguesa, com as portas grandes para nelas caberem quantos quiserem entrar e o amplo salão capaz  de abrigar as reuniões magnas dos portugueses de São Paulo, em ambiente evocativo da sua Pátria, das suas grandezas e, também, do que nela é humilde e poético.

 

Era esta a genial concepção de Severo em relação à Colónia. Não se tratava de separar portugueses de brasileiros mas tão-somente de permitir ao português mitigar a sua saudade e assim amar melhor o Brasil. Para Ricardo Severo, o «imigrante português não tem aqui um objectivo diferencial; a sua missão é brasileira por natural e forçosa afinidade sem que, por esse facto, deixe de ser essencialmente portuguesa».

 

(continua)

 

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Segunda-feira, 13 de Junho de 2011

RICARDO SEVERO – 9

 

 

 

DISCURSO EM 3 DE SETEMBRO DE 1968 NA POSSE DE SÓCIO DO
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO PAULO, PELO CÔNSUL-GERAL DE PORTUGAL

DR. LUÍS SOARES DE OLIVEIRA

TENDO COMO PATRONO RICARDO SEVERO

 

 

 

Mas não era só o edifício que os preocupava. O desenho da cidade deveria ser adequado de forma a proporcionar não só harmonia do conjunto mas também o melhor clima para a habitação do homem. Defendiam que a largura das ruas e avenidas deveria ser proporcional à altura dos prédios.

 

Estes estudos tiveram consequência em muitos dos edifícios que ainda hoje embelezam e dignificam São Paulo: o Teatro Municipal, jóia de harmonia e imaginação; o elegante edifício da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, tão enraizado na tradição e estima dos paulistas; a Penitenciária do Estado, com os seus pavilhões funcionalmente distribuídos; a Faculdade de Medicina, concebida
segundo princípios pedagogicamente adiantados; o Paço Municipal, hoje Secretaria da Justiça, nobre edificação que tanta dignidade empresta ao terreiro que foi berço de São Paulo, etc.

 

Teatro Municipal de São Paulo

 

O neo-barroco da época exerceu influência no estilo de Severo e Azevedo, sobretudo durante o período em que estiveram associados com Domiziano Rossi, mas nunca, de forma tão marcada como no Pavilhão de São Paulo na Exposição Nacional de 1908, estrutura caprichosa e opulenta, com cúpulas e mastaréus, arcos e colunas, arquivoltas, espirais e volutas, decorada por génios alados, efebos e musas, cornucópias, festões e grinaldas e que, apesar de tudo isto, maravilhou os estetas da época.

 

Mas Severo logo procura libertar-se destas influências para aderir à sua via favorita. É ele que nos diz:

«Procurei lançar a orientação tradicionalista na arquitectura brasileira. Era o mesmo princípio que dominou a campanha nas artes, nas ciências e na política iniciada no meu país pela geração que procurei englobar em torno de “Portugália”.

Uma vez aqui, em terras brasileiras, continuei a ser afirmativamente tradicionalista. Tradicionalismo não quer dizer anacronismo, passadismo, ou mesmo necronihismo. Quer dizer simplesmente o ressurgimento da tradição, que é no íntimo de cada família humana o espírito da sua génese, a sua essência vital, a alma das nacionalidades. No Brasil são naturais todas as hesitações; ainda ao sair do primeiro século da sua independência política, encontra-se cercado de influências estrangeiras poderosas e atraentes, levadas por surtos de sedutoras inspirações numa época de tumultuosas transformações no próprio mundo da arte. Entretanto, apartando-se do tradicionalismo estrangeiro e rebuscando a tradição caseira, o Brasil encontrará de certo as suas formas nacionais».

 

Novamente volta Ricardo Severo ao assunto nas colunas do «Estado de São Paulo» (1-4-1917), em defesa do tradicionalismo na arte brasileira. O movimento causa espanto, provoca controvérsia e como tinha acontecido na sua primeira polémica, ganha prosélitos. A «Cigarra» relatava nesse ano, com estranheza, o interesse de alguns paulistas ilustres – Dr. Washington Luís, entre eles – que partiam
para o interior do Estado à procura de «casas velhas» para estudarem o seu plano, o aparelho e a contextura dos materiais. Severo adverte os mais zelosos dos seus discípulos e previne-os contra críticos maliciosas:

«Arquitectura tradicional não quer dizer reprodução literal de fósseis arqueológicos de casas de taipas ou de pau a pique, de igrejinhas de adobo ou de sorumbáticos sobrados dos centros urbanos dantanho, sem higiene e sem aparência estética. Arte tradicional é a estilização de formas artísticas anteriores que integram o meio local, o carácter moral de um povo e o cunho da sua civilização»

 

São Paulo, em muitos aspectos, parece esconder a influência de Severo. Mesmo os exemplos modernos dos modelos que Ricardo Severo preconizou, evoluíram para um estilo mais ático, o que é compreensível. No entanto, no interior, a estrutura da casa respeita o seu objectivo: é feita para proporcionar um viver feliz. Nenhum exemplo será mais elucidativo em tal matéria do que o de sua própria casa, ainda hoje felizmente conservada. Sente-se por toda a parte, naquela estrutura, a predisposição para o amorável, para a fácil comunhão entre vida interior e ao ar livre. É uma casa cheia de intimidade convidativa. Conjugada com o arvoredo que a circunda, esconde-se para despontar apenas aqui e além numa sugestão de beleza. Multiplicam-se os alpendres e os pátios sombreados decorados com plantas e flores. Nas suas balaustradas e paredes, alisares de azulejo invocam os motivos sagrados e profanos do culto português. No interior, o átrio nobre com belos exemplares da arte Joanina onde sobressai um elegante balcão de talha dourada; a casa de jantar grande para que nela tenham lugar todos os que batam à porta e, enfim, o seu escritório, reflexo da personalidade de Ricardo Severo. Peça espaçosa, iluminada por amplas janelas, resguardadas do Sol por um beiral saliente, forrada de estante carregada com os tesouros da sua erudição, teto em caixões pintados a óleo e têmpera, mobília de austero conforto e, final e imprescindivelmente, decorado por um friso a azulejo reproduzindo cenas da vida do povo português no seu trabalho, nos seus cultos e nos seus folguedos. Ricardo Severo reuniu aí tudo o que amava: a sua família em retratos, o Brasil nas plantas que decoravam as janelas, os tesouros do seu saber, os objectos de arte mais gratos são seu gosto e o povo português objecto da sua saudade.

 

(continua)

 

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Quinta-feira, 2 de Junho de 2011

RICARDO SEVERO – 8

 

 

DISCURSO EM 3 DE SETEMBRO DE 1968 NA POSSE DE SÓCIO DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO PAULO, PELO CÔNSUL-GERAL DE PORTUGAL DR. LUÍS SOARES DE OLIVEIRA TENDO COMO PATRONO RICARDO SEVERO

 

 

 

O respeito pelo passado leva-o imediatamente a inspeccionar o Museu Paulista de Archeologia e a discordar. A vontade, sentindo que português no Brasil não é estrangeiro, e que, por isso mesmo, deve dar o seu melhor contributo a esta Pátria que ama e venera tanto como a sua, sai a público no «Correio Paulistano» a formular as suas críticas e sugestões acerca do museu que visitou. Vê-se envolvido em polémica mas as suas observações não caíram em «saco roto». Foram atendidas e nasce o «Museu Histórico do Ipiranga».

 

Em Ricardo Severo manifestou-se sempre esta urgente necessidade de participar, de colaborar, de partilhar com o seu semelhante o seu quinhão de saber, de energia e de amor. Foi este impulso magnânimo que o levou mais tarde a assumir a direcção do Liceu de Artes e Ofícios, continuando assim a benemérita e patriótica obra de grandes paulistas como Cerqueira César, Teixeira da Silva, Gabriel Fransen, Leôncio de Carvalho, Reynaldo Porchat, Mello e Sousa e do seu próprio associado Ramos de Azevedo. Mais tarde, obedecendo sempre os mesmos propósitos e natural pendor de espírito, colaborou com Alcântara Machado e António Piccarolo na fundação da primeira Faculdade Livre de Filosofia, Ciências e Letras como seminário dos futuros professores do ensino secundário.

 

De parceria com Ramos de Azevedo, lança-se ao estudo da arquitectura e da habitação nos climas quentes a fim de determinar um dos pontos cardeais do seu novo estilo. Estudou a arquitectura do indígena brasileiro e a de outras civilizações estabelecidas em climas semelhantes. Ao índio, louva o aparelho de materiais argilosos, a taipa, excelente isolante; ao caboclo, para a uniformidade que deu à arquitectura em todo o solo brasileiro; do português, aproveita a adaptação que fez das suas exigências sociais às exigências do clima brasileiro, criando a casa tipo colonial, vasta, de amplas acomodações, rectangular, de sobrado erguido sobre embasamento de pé direito inferior ao do andar, onde tudo concorre para arejar e moderar os efeitos excessivos do clima externo, com a sua varanda alpendrada servindo de ligação suave e acolhedora entre o exterior e o interior. Verifica que o português adaptou o aparelho de taipa do índio e do caboclo – a que mais tarde adicionou a cal – apenas reforçado para suportar a estrutura maior. «E tão hábeis se fizeram os construtores de taipa que em grandes igrejas ergueram muros de 25 metros de altura com 2,20 metros de espessura na base», comenta em admiração o engenheiro do século XX. Na cidade, desprovida de árvores frondosas, verifica que o português diminui o tamanho das janelas, reduzindo-as a frestas, ou defende-as com aplicação de gelosias à maneira árabe, prolonga o beiral do telhado, simplifica o barroco joanino deixando-o reduzido ao enunciado das suas curvas, em arco simples. No seu estudo, os dois mestres aprovam o tipo de habitação «defendida da intensidade da luz e do calor, ao mesmo tempo recortada e vasada, multiplicando as superfícies de insolação e arejamento, permitindo os abrigos sombrios e a ventilação natural, pelo contraste das temperaturas e, por sua vez, facilitando a vida doméstica ao ar livre isolada do tumulto exterior das ruas». Revestem-se ainda hoje de actualidade impressionante as conclusões dos dois insignes mestres.

 

(*)

 

1 – A casa da fazenda (sobrado), segundo o padrão colonial, realiza quanto à forma um tipo de habitação salubre, susceptível de melhoramentos e perfeita adaptação ao clima e ao regime actual.

 

2 – Devem ser abandonadas as disposições de hotéis ou casas em grandes maciços fechados.

 

3 – O sistema de pavilhões isolados para as habitações colectivas realiza uma solução perfeita adaptável com todas as vantagens aos climas quentes.

 

4 – As fachadas de cimento armado de fina espessura devem ser construídas com paredes duplas.

 

5 – A casa deverá ter um embasamento com altura bastante para isolamento e ventilação do solo e do pavimento que se lhe sobrepõe e um telhado de elementos isolantes que proporcionem uma fácil e completa ventilação do sub-tecto.

 

(continua)

 

 Luís Soares de Oliveira.bmp Luís Soares de Oliveira

 

(*)http://www.google.pt/imgres?imgurl=http://vitruvius.es/media/images/magazines/grid_9/81b4_021-01-05a.jpg&imgrefurl=http://vitruvius.es/revistas/read/arquitextos/02.021/807&usg=__WNlY5wa8bj9QvR52MtYZxsk0vH4=&h=232&w=300&sz=46&hl=pt-PT&start=0&zoom=1&tbnid=by142pnaZJbruM:&tbnh=127&tbnw=164&ei=G5TnTdhyjYCFB86-7bUK&prev=/search%3Fq%3DRicardo%252BSevero%26um%3D1%26hl%3Dpt-PT%26sa%3DN%26biw%3D1007%26bih%3D681%26tbm%3Disch&um=1&itbs=1&iact=rc&dur=131&page=1&ndsp=23&ved=1t:429,r:8,s:0&tx=96&ty=79

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Quinta-feira, 26 de Maio de 2011

RICARDO SEVERO – 7

 

 

DISCURSO EM 3 DE SETEMBRO DE 1968 NA POSSE DE SÓCIO DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO PAULO, PELO CÔNSUL-GERAL DE PORTUGAL DR. LUÍS SOARES DE OLIVEIRA TENDO COMO PATRONO RICARDO SEVERO

 

 

UM PORTUGUÊS NO BRASIL

 

Transferido para o Brasil , definitivamente, em 1909, Ricardo Severo ia conhecer, vivendo-a, a epopeia moderna de sua raça. Aqui casou com senhora da distinta família paulista Santos Dumont. Cedo iria definir a sua atitude de português no Brasil.

 

O discurso que Ricardo Severo pronunciou ao ser recebido neste Instituto em 1912, termina da seguinte4 forma: «Como um voto dos mais humildes, perante vós, doutos e estimados confrades, o meu compromisso de iniciação tomado à entrada do vosso grémio, trabalhar em prol das vossas tradições nacionais que tanto me merecem como as tradições nacionais da minha Pátria.»

 

A vida de Ricardo Severo no Brasil é um exemplo de fidelidade a este voto. Perante a nova fenomenologia, Ricardo Severo, o português, só podia reagir duma maneira: procurou informar-se sobre as origens da cultura brasileira, respeitou-lhe a sua genuinidade e procurou enriquecer-lhe o património com a experiência válida que trazia consigo.

 

Ricardo Severo veio para o Brasil para exercer o seu «ofício de alvanel» no que foi ajudado, logo de início, pela sua feliz associação com Ramos de Azevedo, o homem empenhado em transformar o burgo sito no topo do outeiro localizado por Manoel da Nóbrega, numa grande metrópole moderna.

 

Ramos de Azevedo

 

Severo associa-se muito cedo a essa obra e põe nela tudo o que pode dar: o seu amor à tradição, ao genuíno, ao telúrico, a sua preocupação de equilíbrio mesológico, o seu exigente perfeccionismo e a sua aspiração de engrandecimento e dignificação do homem. Assim começa a crescer a metrópole Paulista de Archeologia e... a discordar.

 

(Continua)

 

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Domingo, 22 de Maio de 2011

RICARDO SEVERO – 6

 

 

DISCURSO EM 3 DE SETEMBRO DE 1968 NA POSSE DE SÓCIO DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO PAULO, PELO CÔNSUL-GERAL DE PORTUGAL DR. LUÍS SOARES DE OLIVEIRA TENDO COMO PATRONO RICARDO SEVERO

 

 (*)

 

Durante V séculos, o árabe assenhoreia-se de quase todo o território lusitano submetendo os povos à sua força e à sua cultura superiores. Comenta Ricardo Severo: «A par e passo que o domínio árabe vai diminuindo, surge desde os confins do Algarve até às fronteiras da Galiza um povo possuindo o mesmo modo de sentir e de pensar a mesma língua, conservando a toponímia pré-romana e ligado aos seus castros, aos seus dólmenes, às suas fontes, por uma infinidade de tradições que, sem dúvida, tem raízes pré-romanas». A solidez e coesão deste povo permite-lhe resistir a todos os cataclismos históricos e, ultrapassados estes, chamar a si, assimilando, os elementos humanos e culturais do inimigo da véspera. A nação ilustrou-se de leis com os romanos; com os árabes adoça os seus costumes e povoa-se de lendas que evidenciam o fascínio que exerceu sobre o montanhês a beleza da mulher moura. Manifestaram-se assim os primeiros sintomas de exogamia e endocultura, binário que iria impor a feição única da nossa história.

 

Estava revisto o erro histórico de Herculano que negara relações de afinidade entre a Nação actual e essas tribos de lusitanos sitos ao sul do Douro ao afirmar que «Portugal nascido num ângulo da Galiza constituído sem atenção às divisões políticas anteriores, dilatando-se pelo território do Gharb sarraceno, é uma Nação inteiramente moderna».

 

Ricardo Severo não pretendeu construir uma doutrina sobre a formação da nacionalidade. Na sua humildade de mesteiral, limitou-se a reunir subsídios para a formação dessa doutrina. Ele próprio reconheceu a necessidade do trabalho de uma equipa. Com efeito, do seu montanhês até à formação cultural da Nação portuguesa que se apresenta consolidada em 1385, há um longo caminho a estudar. As pesquisas do seu companheiro Alberto Sampaio sobre a formação das póvoas no litoral português, fenómeno este inteiramente moderno e que marcou a trasladação do eixo nacional da montanha para a orla marítima, fixando aí o centro de gravidade do novo português, tem uma relevância considerável para a compreensão e caracterização do génio da raça.

 

A grande contribuição de Ricardo Severo como historiador consiste, a meu ver, na sua aceitação do maravilhoso lado a lado com o documento real, como elemento de compreensão da verdadeira alma do povo. Definitivos ou incompletos, os estudos de Severo muito contribuíram para o ressurgimento do Portugal contemporâneo. A Nação reencontrou o fio da sua história e reintegrou-se no sentido da sua tradição. Esqueceu e superou os estádios mórbidos  que durante três séculos dominaram a sua vivência com menor ou maior intensidade, sob influências estranhas e perniciosas que se imiscuíram no organismo social em consequência de grandes traumatismos políticos. Restabelecida a ordem nas «tribos lusitanas», com o advento de um Estado forte e de orientação nacional, reposta na sua genuinidade a tradição do povo, a Nação encontrou de novo coesão e segurança no seu caminhar, certeza dos seus valores e confiança na sua capacidade para cumprir um destino histórico singular e que, cada dia, se revela mais meritório num mundo incapaz de partilhar experiências humanas ou assimilar etnias, num mundo cada vez mais carente de um elo de fraternidade entre as raças e os povos.

 

É a Pátria com que Ricardo Severo sonhou. Escutemos um passo da sua oração aos portugueses em 1914: «Nós recitamos os cantos dos Lusíadas com ênfase, como o Evangelho de uma raça, a epopeia heróica dos seus feitos e das suas virtudes, imortalizados nesse bronze imarcecível, símbolo imorredoiro de um povo que foi e será grande. Se, por vezes, a saudade nos invade a alma e, em plangente oração, voltamo-nos para a imagem da Pátria, sonhamos, sonhamos nós – os da modesta grey de Portugal – com uma era de renascimento da Pátria dos Lusíadas. Que importa? Prosseguiremos nosso sonho!».

 

(continua)

 

 Luís Soares de Oliveira.bmp Luís Soares de Oliveira

 

(*)http://www.google.pt/imgres?imgurl=https://1.bp.blogspot.com/_CQsXeyLN7iQ/TGK2P8iEJcI/AAAAAAAAGx4/1L5MbwqN378/s1600/Castro%2BCristelos.jpg&imgrefurl=http://espacoememoria.blogspot.com/2010/08/vestigios-arqueologicos-em-casa-romana.html&usg=__NOF2qDD8Szi_Z7b3Ulq-u8QzUEs=&h=393&w=600&sz=86&hl=pt-PT&start=0&zoom=1&tbnid=-zOs_afp6iwbCM:&tbnh=124&tbnw=165&ei=Q9nYTZ6fAoKKhQf9jLnEBg&prev=/search%3Fq%3Darqueologia%252Bcastro%26um%3D1%26hl%3Dpt-PT%26sa%3DN%26biw%3D1007%26bih%3D681%26tbm%3Disch&um=1&itbs=1&iact=rc&dur=156&sqi=2&page=1&ndsp=20&ved=1t:429,r:11,s:0&tx=89&ty=53

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